“É livre a manifestação do pensamento e da expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, sendo vedado o anonimato. (CF 88).”

28 de ago. de 2012

União poliafetiva: registro pode ser nulo


O que deve ficar bastante claro para as pessoas é que estas são livres para firmar entre si os mais variados e inusitados vínculos afetivos, todavia, não se pode exigir do Estado proteção jurídica a tais situações fáticas extravagantes, mormente, quando persistem princípios estruturantes no sistema normativo em que vedações expressas delimitam a autonomia privada dos casais.
Mais grave ainda é o efeito propagador da mídia impressa e televisiva, em que os veículos de comunicação preocupam-se muito mais em divulgar do que esclarecer as pessoas das repercussões sociais e jurídicas de tais comportamentos atípicos, dando-se a entender que tal prática encontraria abrigo na legislação em vigor.
Pondere-se, por oportuno, a responsabilidade do profissional envolvido na redação do referido instrumento, vez que, enquanto delegado da função notarial estatal deve zelar pela licitude e regularidade das declarações emanadas dos particulares, não sendo razoável admitir a lavratura de escritura, cujo potencial de nulidade mostra-se extremamente elevado.
O particular, enquanto leigo, deposita confiança no instrumento lavrado perante um Tabelião de Notas, edificando legítima expectativa e boa fé quanto à validade jurídica do documento, não sendo lícito ao Estado perpetuar a insegurança jurídica das próprias partes e dos terceiros eventualmente atingidos pelo ato praticado. 
De todo o exposto acima, concluímos que tal pretendida declaração de união poliafetiva encontra-se fulminada pela nulidade absoluta, não produzindo qualquer efeito jurídico seja entre as partes, seja perante terceiros, haja vista a vedação expressa contida no ordenamento normativo quanto à manutenção plúrima de vínculos de convivência civil.

União poliafetiva: ousadia ou irresponsabilidade?
Cesar Augusto Rosalino

A recente lavratura de uma Escritura de União Estável entre três pessoas na cidade de Tupã, Estado de São Paulo, está fulminada pela nulidade absoluta, haja vista a vedação expressa contida no ordenamento normativo quanto à manutenção plúrima de vínculos de convivência civil.
A comunidade jurídica foi surpreendida com inusitada situação advinda da lavratura de uma Escritura de União Estável entre três pessoas, fato este ocorrido na cidade de Tupã, interior do Estado de São Paulo.
Embora não haja consenso sobre a natureza do referido documento, se pretendia regularizar uma mera sociedade de fato, ou inovar a ordem jurídica com a institucionalização da poligamia, segundo informações obtidas na internet, trata-se, efetivamente, de uma declaração de convivência plural entre um homem e duas mulheres.
Curioso notar, que tal ato foi lavrado perante um Tabelião de Notas, delegado do Poder Público, nos termos do artigo 236 da Constituição Federal, responsável civil e criminalmente perante as partes e terceiros, eventualmente prejudicados pelo ato praticado, conforme disposto nos artigos 22 a 24 da Lei nº 8935/1994.
Cumpre notar que não se pretende censurar a postura da referida profissional, haja vista a existência de órgãos correcionais voltados à apuração funcional dos eventuais excessos cometidos, todavia, o debate sobre tema de tão graves repercussões sociais merece atenção redobrada por parte da comunidade jurídica.
A Doutrina familiarista evolui a passos largos, atravessando a reformulação de clássicos conceitos sedimentados no Direito Civil por décadas, a ponto de não se reconhecer mais unidade, coerência e integridade no ordenamento vigente.
Se por um lado tais inovações vanguardistas buscam assegurar direitos a uma minoria, até então marginalizada pelo direito posto, de outra parte, surgem, inevitavelmente, questões que desafiam a criatividade de doutrinadores, juristas e magistrados, na busca de soluções viáveis para pacificar conflitos oriundos de uma “sociedade líquida”.

Confesso que me causa certa apreensão o nível de permissividade das relações pessoais construídas nesta sociedade hedonista, volúvel e imediatista, em que pessoas e produtos se confundem, alheias a valores e significados.
O direito, definitivamente, não é aquilo que o intérprete quer que ele seja, sob pena de se subverter a ordem democrática vigente, subordinando relações sociais ao arbítrio de cada um, a ponto de não se justificar mais a existência de um Estado organizado, dotado de soberania e supremacia perante o cidadão.     
Parafraseando o Professor Lênio Streck, o “Direito acaba sendo conceitos sem coisas”, um emaranhado de subjetividades plasmadas por vaidade intelectual que acabam por desaguar na desordem e insegurança jurídica.

“O Direito não está ao nosso dispor. Ou seríamos pequenos tiranos, ao estilo le droit c'est moi. Interpretação não é ato de vontade. Os sentidos dos textos não estão ao nosso dispor. A interpretação é um encontro. Uma fusão de horizontes (o do texto — inteiro alerte-se — e o do intérprete).

Neste aspecto, convém ressaltar a inexistência de quaisquer postulados de ordem moral ou religiosa para a análise da viabilidade jurídica de eventuais “uniões livres”, limitando-se aos aspectos sociais e jurídicos da nova formatação do conceito de família no Direito Civil brasileiro.
Despido de todo e qualquer pré-conceito (ou preconceito) arraigado no âmago de uma sociedade em eterna (re) construção, o fato é que, não se pode aceitar, passivamente, a máxima que se transformou na grande bandeira de parte da Doutrina no que tange ao Direito de Família.
Afirmar irresponsavelmente de que “onde houver afeto, haverá família”, é simplesmente ignorar a existência de balizas conceituais mínimas, necessárias para a viabilização do saudável desenvolvimento dos seres humanos.
Com a devida e melhor vênia de entendimento contrário, não se pode obrigar o Estado a conceder proteção jurídica a todo e qualquer arranjo de pessoas unidas por víinculo de afeto, sob o risco de se institucionalizar o caos nas relações sociais, retornando-se à barbárie inconseqüente.
Apenas como exemplo, um homem de 32 anos pode  perfeitamente nutrir sentimentos por uma garota de 13 anos, mantendo com esta, vínculo afetivo e sexual, todavia, tal arranjo não merece a chancela estatal, não sendo reconhecido como família, mas como estupro de vulnerável, tipificado no artigo 217-A, do Código Penal, cuja presunção de violência é absoluta conforme recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça.
No mesmo sentido, não há de se duvidar da existência inúmeros relacionamentos afetivos extravagantes em meio à vastidão do território nacional, nos quais, pais e filhas, mães e filhos, irmãos e irmãs, homens e animais, convivem conjugalmente, todavia, tais uniões alheias ao ordenamento em vigor jamais gozarão de proteção jurídica, merecendo atenção de outros profissionais da psicologia ou mesmo da psiquiatria.
 O que se pretende afirmar, é que as pessoas possuem sim livre arbítrio fundamentado na autonomia da vontade privada para manterem relacionamentos afetivos (e sexuais) da melhor maneira que lhes convier, e quanto a isso, inexistem restrições a serem feitas pelo Estado, desde que tais escolhas limitem-se à esfera da intimidade pessoal.
Todavia, a partir do momento que tais uniões desbordem os modelos tipificados pela legislação em vigor, inexistirá a obrigação estatal em conceder reconhecimento jurídico aos mais variados e imprevisíveis arranjos denominados “familiares”.
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Nota: grifos da editora do blog


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